segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Filminho bom :)



Outro dia assisti um filme que não é tão recente e que já havia assistido antes, só que apenas algumas partes. Ele se chama Ponte para Terabithia. Em plena fase de tecnologia abundante, onde o prazo de validade para cada aparato é de, no máximo, um ano, onde as crianças ficam quietas e quase hipnotizadas na frente da tela de uma tv, laptop, tablet, netbook, celular e o que mais inventarem até este texto sair, com suas imagens coloridas e jogos incríveis; assisto a história de uma nenina, que não tem televisão em casa e que, talvez exatamente por isso, dá asas a sua imaginação. Com os olhos fechados e a mente aberta, como a persoangem principal diz no filme, Leslie Burke conhece Jeese Aarons e juntos, concebem uma cidade cheia de ação, de aventura, de criaturas fantásticas, dignas de uma imaginação fértil e um coração pulsante. Tudo o que se torna cada vez mais raro de se ver nas crianças de hoje em dia. Sem apologias ao passado, acho que a criança tem que seguir a vida assim, com a mente aberta, para que sua imaginação crie asas e ela possa se tornar um adulto mais saudável, não cheio de ler/dorts, por passar horas na frente do computador, apenas, reproduzindo cenários já reeditados.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

MSC Opera



Sabe aquela música, dos Paralamas do Sucesso, "entrei de gaiato no navio, oh, entre, entrei, entrei pelo cano"?! Pois é! Foi exatamente assim que me senti. Ao começar em janeiro a pagar por esse tão "maravilhoso" cruzeiro, de 15 dias, que aconteceria no final do ano, achei um sonho romântico viajar acompanhada pelos mares europeus até o Brasil. Pensei que seria uma fomra mais divertida e econômica de conhecer várias cidades européias, de modo mais tranquilo. Mas, como já deve estar claro não foi nada disso.

A imagem parece bonita, né, mas não se enganem, não me engano amis, é totalmente ordinário!

Primeiro, o navio era território dos fumantes, havia cheiro de cigarro e bituca de cigarros em todos os cantos. Imagine andar em corredores longos, fechados, com aquele cheiro de cigarro impregnado! Sentir o cheiro do cigarro da cabine vizinha invadindo a sua e você não ter pa´ra onde ir. Fazer o que? Se jogar no mar?!

Segundo, a sujeira estava, como o cigarro em todas as partes, pelos corredores, pelos halls, na beira da piscina, ao aldo de cada uma das cadeiras. O chão grudava! Nos corredes do meu pavimento, o que não faltavam eram bamdeijas com restos de comida que ficavam ali, fermentando até a noite cair. E imagine você, o navio balançava mais que bambu em vendaval. E a quantidade de idosos era enorme, eu mesa tropecei numa bandeija com comida deixada no chão, imagine os senhorzinhos e senhorinhas, tods se tremendo, sendo jogados de um lado a outro do corredor. Além da sujeira por todo o navio, tinha asujeira da cozinha. Encontrar garfos, facas, pratos, copos e xícaras limpos era como tirar na mega sena!

Terceiro, o navio parecia a avenida sete no carnaval, tremia, gemia, balançava tanto, que o estômago embrulhava, os gases subiam. Num dos dias do navio, me dobrei no chão, de gases e enjôo. Não sabia se vomitava ou se pedia um penico.

Quarto, a televisão. Visualize a cena. O navio com 3000 passageiros , em sua maioria argentinos e brasileiros e ao ligar a Tv os canais são todos em línguas extrangeiras: francês, alemão, italiano e quando se dava sorte, inglês.

Quinto, a comida. 15 dias e a variação do cardápio era digna de um restaurante a kilo na Carlos Gomes. Vários itens estragados, especialmente carnes e frutas. E, assim passei 15 dias comendo sopa e massas. Quando a gente ia ao restaurante, para ver se o cardápio variava, demorava tanto, que jantava o pão que serviam antes e já sem fome, constavava que os pratos haviam vindo errados.

Sexto, os preços. Confinados no navio, tudo ali eram os olhos da cara. TEntei não gastar quase nada, mas fui assaltada com uma taxa de serviço, que não vai para os funcionários, sei porquê perguntei a mais de 7 funcionários diferentes, de 6 euros por dia, por pessoa na cabine. No contrato deles diz que se você não está satisfeito, você não é obrigado a pagar,a realidade, como me confirmou o guest relation manager, Sr. Pavel, não é essa. Quebra de contrato e um sorisso, com todas as minhas queixas devidamente anotadas, indo diretamente para o lixo, após minha saída. Depois da conversa nada amistosa, com o representante supra-citado, fui tomar uma cerveja a beira da piscina, tava economizando tanto que não tinha comprado nada no navio. Tava no inferno, abracei o capeta. E foi literal. Sob o sol escaldante do Atlântico, deixando a cidade de Recife recebo um chopp quente pela bagatela de cinco euros. E, pensei, vou trocar, aí, claro, como tudo no navio, o outro também, veio quente! O capeta foi quem me abraçou!

Sétimo, a piscina. Vídeo cassetada total, era entrar, achar ótimo, sair escorregar e cair no brilhante chão que cercava toda a piscina. Imagine o equilíbrio para os idosos....

Oitavo, informações. Um funcionário diz uma coisa, outro diz outra. Claríssimo que ali ninguém sabia nada! E ninguém se comunicava!

Nono, a animação. Eu, super animada, para não dizer o contrário. Me sentia uma prisioneira do anvio. Fui pegar jogos. Pergunto eu, para que ter jogos, se as peças estão faltando! Cobrando seis euros por dia de cada uma das cabines dos 12 pisos do navio, eles não tiverem dinheiro para comprar jogos novos?! Não os deixasse para o público pegar e descobrir, depois do jogo todo montado, que tudo foi tempo perdido!

Então, só para concluir, preciso reafirmar que este MSC OPERA e todas as suas outras linhas não passam de uma fomra muito bem elaborada de vender gato por lebre. Nunca mais entro de gaiata num navio!!

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A Travessia



Tinha todas as razões para ficar no mesmo lugar. Mas a aparente imobilidade da condição lhe gerava cansaço nas pernas, na coluna e nos braços. Entre ela e o outro lado, um rio largo, marrom, exuberante. Sentou-se ponderando se atravessar seria realmente melhor do que ficar ali sentada na relva. Ao mesmo tempo que aquele pedaço de terra verde lhe parecia bonito, era do outro lado que estava o gado e a terra fértil. Tudo bem que ela teria que primeiro conseguir atravessar ela própria, atravessar o gado, e ainda, plantar frutas, verduras e hortaliças. E vá lá, cada uma dessas coisas tinha um tempo diferente de crescimento. Sentiu as formigas lhe beliscarem os pés, como se lhe empurrando ao movimento. Mexeu-se um pouco, saiu do local onde estava, mas ainda não estava muito animada. E se o rio lhe engulisse? E se os bois morressem na travessia? E se o que ela plantasse não desse frutos? Sentiu o sol lhe queimar forte as costas. É! Parecia a ela que aquele era o momento certo para cruzar o rio. O sol, as formigas, seu próprio corpo lhe pediam movimento. Quando ergueu-se novamente, um pouco trêmula, mas decidida, viu como se por mágica, as águas do rio baixarem. E colocou um pé na água. Sentiu o frio subir-lhe até a espinha e o tirou rapidamente da água para a terra firme. No que ela estava pensando? Abandonar a terra firme por aquele aguaceiro todo, que tinha nada de solidez?! Voltou a sentar-se. Espantou os pensamentos e ficou contemplando o outro lado. Desde que compreendera que era do outro lado do rio que encontraria vida fértil e deixaria de lutar contra a aridez da terra que passou a sonhar em chegar lá! Mas, o que a impedia?! O rio! Respondeu alto a pergunta imaginada. Mas, sabia que seu maior impedimento era seu medo. E tinha tantos, medo de morrer, de perder-se, de afundar ... medo de ser feliz.... E achando irracional ser ela própria a causadora de seu infortúnio, ergueu-se corajosa. Colocou o mesmo pé que há poucos minutos tirara da água de volta a ela. Esperou ambientar-se, depois o outro. Apertou os olhos e quando os abriu, viu a água baixar novamente. Começou a recitar para si mesma, "Atravesse! Atravesse!" - seria tão mais fácil se tivese um fio, ou qualquer coisa que lhe desse mais firmeza para caminhar sobre aquelas pedras com a força da água lhe chacoalhando os ossos. E resolveu imaginar um fio grosso, dourado, que ela segurava forte nas mãos e que ajudava seu corpo a ficar mais firme. Só então abriu os olhos e deu-se conta que estava quase chegando. Quando tocou no outro lado da margem, deixou-se cair no chão, trêmula. Havia desafiado o rio, seus medos e havia vencido. E dançou feliz a conquista, gritando aos setes cantos, Atravessei! Atravessei! e soube naquele mesmo instante, que apesar do medo, era muito mais corajosa do que pensava. Virou de costas, viu aquele mundaréu de terra. Tirou do peito algumas sementes e saiu semeando a terra com o novo. Quando terminou, tinha certeza de que colheria os melhores frutos.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

As aventuras de Morena

Com uma trouxa de roupa na cabeça, os joelhos gastos, as juntas duras, olhou para cima para contar quanto ainda lhe faltava para chegar no topo do morro e alcañçar, finalmente, o seu bairro. A visão daquela escadaria imensa, que aprecia não ter fim, lhe desanimou e ela preferiu seguir cabisbaixa. Não havia sentindo em parar. Para onde quer que olhasse só via escada, lixo e céu azul. Seu bico de papagaio havia paralisado seu quadril e cada passo lhe custava um esforço enorme. Mas resolveu seguir, não era isso que fazia há cinquenta anos, seguia a vida? Fechou os olhos por um momento e as lembranças dos tempos em que a vida a seguiam lhe encharcaram as faces de lágrimas. Já não podia mais aguentar e sentou um pouco para descansar. E começou a se lembrar de todas as estórias que ouviu sobre si mesma e as que ela própria havia guardado no coração.




Ela nasceu num dia de céu azul e nuvens bem brancas de um verão qualquer, em pleno carnaval. Seu nascimento se confundiu então com a festa de rua e todo aniversário parecia que o bairro todo comemorava a sua chegada. Não era nem branca, nem negra, sua pele era de cor de avelã e por isso lhe batizaram de Morena. Não tendo tempo de chegar até o hospital pela confusão do carnaval, a mãe lhe teve no meio da sala, sob o olhar vigilante do avô e as mãos cuidadosas da avó. Daí em diante sua vida parecia ser uma eterna aventura. Corria o tempo todo de um lado para o outro. Seu bairro, pequeno e cercado de escadas tortas, se localizava no alto do morro e lhe parecia enorme, grande o suficiente para abrigar o mundo. Seu Clark do mercado era americano, Seu Olivier da quintanda era francês, Seu Manuel da padaria, português, Seu Juan do açougue, espanhol e Seu Zé do bar, brasileiríssimo.E era justo no bar que todos se reuniam nas sextas feiras à noite, para beber e relembrar histórias de outra vida. E foi assim que aprendeu sobre o mundo, seus costumes e línguas. Aprendeu ainda palavras soltas de outras línguas. Quando se cansava, deixava a mãe e o namorado daquele dia e saía montada em sua bicicleta e em compainha dos amigos para explorar e encontrar aventuras. E toda sua meninice foi assim, sua vida se resumia as pessoas e coisas que compunham seu bairro. Na sua adolescência as coisas começaram a mudar por ali, ela própria havia começado a mudar. Seus companheiros de aventura a haviam abandonado para caçar fora dos limites do bairro e trouxeram para lá coisas que, pela reação deles, não parecia ser bom. Seu avô batizou a novidade de droga e a proibiu de andar com esses rapazes ou usar a tal droga. Mesmo que não a tivesse proibido, não usaria, para ficar abestalhada como eles? O que eles viam na idiotice? Um ano mais tarde, quase todos os seus amigos haviam se rendido às drogas. Apenas um não usava, mas convidava a todos para provarem, de graça, se fosse a primeira vez. Seu avô, o chamou de traficante e, na escola, perguntou a professora o que aquilo significava. Assustada, achou que era a pior profissão do mundo e foi ter com Geninho, para lhe abrir os olhos da besteira que estava fazendo. Quando chegou na casa de Geninho, ele estava sozinho. A mãe o havia abandonado quando tinha seis anos, para seguir um espanhol, de nome Estebán, por quem havia se apaixonado. Seus avós se encarregaram de criá-lo, mas faleceram no ano passado; o avô, que trabalhava na mina, foi engolido por uma máquina de moer pedra para achar tesouros e a avó, morreu quando soube da notícia, seu coração partiu. Desde então Geninho havia ficado sozinho e não gostando de trabalhar para não morrer como seu avô, optou por um trabalho mais leve, entretanto, bem mais perigoso e vergonhoso, tornou-se traficante. Geninho lhe olhou com olhos de cachorro quando vê cadela no cio. Ela se manteve a uma certa distância para conseguir se fazer ouvir. Sentia medo, mas não ousava baixar os olhos, nem se desgrudar das palvras que saltavam de sua cabeça para sua boca. Seu suór frio ia ficando pegajoso quanto mais respirava aquele ar contaminado daquele odor acre de droga. Quando terminou de abrir os olhos sobre a bobagem que estava cometendo, Geninho foi duro e seco, como sua aparência, lhe disse apenas que ela não era a mãe dele, que se tivesse a ousadia de ir apra sua casa proferir desaforos, seria encontrada morta numa vala, e suspendeu a camisa para lhe provar que não estava de brincadeira. Morena viu pela primeira vez na vida, uma arma, que Geninho chamou de três oitão. Saiu com as pernas bambas andando em passos compassados, até que quando estava longe do olhar ameaçador do traficante, saiu correndo, até que sentiu seu medo se desfazer em cansaço e parou. Decidiu que não se meteria mais na vida de quem quer que fosse, por melhor ou pior que conhecesse a pessoa. Durante uma semana se escondeu em casa, receosa de ruzar novamente com Geninho. Mas, como não se pode fugir do destino, ainda mais num bairro tão pequeno.... Um tempo depois, quando já não se lembrava mais da estória, saiu para dar um passeio a pé pelo bairro, quando viu uma figura trôpega vir em sua direção. Era Geninho, muito bêbado. Disse-lhe que ela estava certa, que aquilo não era vida para ele, que aquilo era a própria morte. Acrescentou que havia matado o primeiro rival, que era a primeira vez que havia usado a arma, por sorte, havia se lembrado de carregá-la. Mas depois que se mata um, que se toma o ponto de outro, a estória vira uma questão de honra, vida e morte. Que seu porre era fruto da consciência que Morena lhe havia implantado e que estava indo buscá-la, porque havia decidido, precisava de uma mulher como ela ao lado. E a partir daí, Morena já não o escutava, correu o quanto pode, mas de tanto medo, saiu tropeçando nas pedras, nas calçadas irregulares, até que sentiu o peso do corpo do home cair sobre o dela. Era uma luta mesclada de sangue de um morto qualquer, dor, lágrimas, murros e pontapés. Até que seu sangue começou a escorrer primeiro da face, depois de suas partes íntimas, sentiu uma dor lascinante lhe furando o ventre e transformou a dor em mordidas, arranhões e novos pontapés. Quando conseguiu se desvencilhar do homem, voltou a correr com o vestido aos trapos. Ouvindo sua voz ao fundo gritando ente sorrisos, que ela era linda, a mulher mais maravihosa que já conhecera, era bela e forte.




Nos dias seguintes foi sentindo um calor lhe subir por ente as pernas cada vez que pensava no traficante. Mas não era mulher de malandro, não iria atrás dele. Mas não precisou fazê-lo, Geninho veio até sua porta, pedir aos avós que lhe permitissem namorar a neta - já que sua mãe também havia partido para São Paulo, para tentar melhor sorte na cidade grande. Incrédula, Morena esperou a negativa, porém essa nunca chegou. E começaram a namorar. De tanto namorar, Morena engravidou em menos de um mês. Geninho lhe pediu que abortasse, traficante não podia ser pai de família. Entretanto, Morena não lhe deu ouvidos. Sonhava em ser mãe e seguiu com a gravidez. Quando já estava com oito meses, Geninho não viu outra alternativa a não ser partir para um trabalho formal e deixar a bandidagem. E assim o fez. Loureno nasceu marrom claro. Tinha as feições do pai e o temperamento da mãe.




Seguiu a infância exatamente como a mãe. Correndo atrás de aventuras pelo bairro. A mãe o acompanhava ao longe, como fizera sua própria mãe. No dia 02 de fevereiro, dia da festa de Yemanjá organizada pelos moradores do bairro, quando as famílias iam juntas reunir-se para orar e deixar os presentes para a Rainha do Mar, Morena se arrumava e arrumava o menino para a festa quando ouviu batidas na porta, que se tornavam cada vez mais violentas. Antes que pudesse segurá-lo Lourenço avançou apra a porta e bateu nela também, achou que alguém brincava com ele, até que a porta veio abaixo, Lourenço correu para os braços do pai, que ao ver os homens o jogou no chão violentamente, antes de cair ele mesmo, violentamente, no chão. Geninho morreu no ato, após receber treze tiros de homens, que Morena só pode descrever para a polícia que chegou apenas após o enterro, como jovens drogados.




Morena então se viu mãe solteira. E teve que deixar os limites antes tão seguros do bairro para rumar para a cidade em busca de emprego. Quando viu aquelas escadas tortas, as ladeiras remendadas, a infinidade de nuvens no céu, enxugou com as lágrimas as lembranças de estar num vale perdido, fincado na paz roubada. Optou por descer a ladeira e se divertiu com o próprio rebolado. A cidade era uma lástima. Gente correndo, se atropelando, sem se olhar nos olhos. Ninguém dava atenção à ninguém. Todos no ônibus faziam contato apenas com um aparelho que lhe tapava os ouviso, como se assim pudessem silenciar os sons externos. Os muitos carros buzinavam tanto, que pareciam, guisos estridentes de impaciência. Se segurou nas pernas para não se deixar levar por aquele tormento frenético e sentindo que as forças lhe faltavam tirou os sapatos que lhe apertavam os dedos e lhe desequilibravam para buscar a firme sustentação do chão. MAs este também termia com o passar os ônibus e caminhões. Apertou forte os olhos e se convenceu de que partia para uma nova aventura. E foi assim, imbuida do espírito de caçadora que encontrou um supermercado e decidiu entrar. Conseguiu empregar-se como caixa, nesse mesmo hipermercado. Depois de alguns meses, as aventuras cederam espaço para o marasmo. A cidade não lhe causava mais espanto ou surpresa. Trabalhava muito, ganhava pouco. Teve que conter-se para não entrar na insatisfação permanente (e justificadas) de suas colegas de trabalho. Estava claro porquê seu ex companheiro havia optado pela bandidagem. Porém cada vez que saía não tinha desejo de voltar ali, nem mesmo pelo seu filho e fazia cada vez mais hora extra.




Um dia, numa de suas idas e vindas pelas ladeiras e escadas do bairro, conheceu Roberto. O rapaz lhe pareceu muito mais novo que ela, mas àquela altura já fazia dez anos que o pai do seu filho havia partido e pensou que não lhe faria mal ofertar-se esse consolo. Roberto era caminhoneiro e fazia entregas para a quintanda, para o açougue e para o supermercado. O francês, o americano e o português haviam fechado um acordo, que eles batizaram de euroamérica e, por isso, contrataram os serviços de Roberto. Os estrangeiros já estavam tão senis que não tinham mais disposição de subir e descer as ladeiras e escadas do bairro e desonfiavam que os próprios filhos lhe surrupiavam. Então, uniram-se em prol do bem comum. Roberto era um touro na cama, mas tinha um fraco pelo álcool. Quando bebia, quebrava a casa quase toda, os poucos móveis e louça. Morena não ligou muito para isso, até que o homem começou a lhe pegar também. Foi aceitando os golpes, como fardo do destino, até que ele quis pegar seu filho. Nesse dia descobriu-se grávida de outro rebento e cega de vingança. Lourenço, muito mais fraco e mirrado que Roberto havia desmaiado com o primeiro soco, mas o caminhoneiro insistia em lhe dar chutes, como para ter certeza de que estava desmaiado. Morena, com precisão cirúrgica lhe cravou a faca de cortar carnes nas costas e o homem tombou no chão. Tentou erguer-0se, a mulher lhe tirou a faca, lhe cravou no peito.




Morena disse mais tarde a todos que Roberto havia se matado. Ninguém lhe fez perguntas, apenas aceitaram a estória. Afinal, a paz reinava novamente no bairro, sem os gritos horripilantes que vinham da cas dela toda sexta feira. Lourenço partiu para a vida, nãos em antes, jogar na cara da mãe que jamais a perdoaria por elvar para casa tal brutamontes e por não ter previsto as consequências. Morena ouviu calada, cabisbaixa. Chorou por uma semana inteira e quando o novo rebento chegou já estava com 44 anos e o rebento chegou meio vivo, meio morto. Mas tornou-se uma mulher muita bonita, que ela batizou de Esther. A filha se mudou para outro bairro. Dizia não aguentar aquele mundo pequeno em que a mãe vivia e detestava a pobreza, faria dinheiro não importava como. A menina havia nascido para os luxos, para as regalias, não para o comedimento. Tampouco ahvia nascido para os homens, só gostava de mulheres. E Morena aceitou isso, sem questionar ou se irritar. Pela filha soube que Lourenço se mudou da Bahia para morar no interior, no coração das Minas, foi buscar novas aventuras. Esther, por sua vez, abriu um salão de beleza, que ela chamou de Estrela. Frente a condição da mãe, a filha era realmente rica.




Morena não aceitava ajuda de ninguém. Havia criado os dois filhos sozinha, com o dinheiro que ganhava e, mesmo agora, que havia sido afastada por uma doença crônica incurável, que a tornava imprestável até para as habilidades domésticas, que os médicos batizaram de LER/DORT, provavelmente pela dor que gerava nos iletrados. Mesmo agora, não queria esmolas, manteria a dignidade. Começou então a passar roupa nas casas de Madame. Como preferia trabalhar em casa, levava as roupas na cabeça para casa, para devolvê-las no dia seguinte. Tinha suas razões para deixar o bairro, mas nenhuma para retornar a ele. As pessoas que amara já não pertenciam a esse mundo. Os filhos eram donos de outros mundos, agora. A Ler/DORT lhe havia tirado parte do movimento dos braços, dos joelhos e secado para sempre sua lombar. Preferia morrer só, do que aventurar-se com um outro homem. Os que passaram em sua vida foram o suficiente para lhe partir o coração. Quando esse pensamento lhe chegou a cabeça, o vento balançous eu corpo, como se o embalasse e desatou o nó de sua trouxa. Morena levou uma de suas mãos à trouxa e a outra para o coração. Sentiu ele partir-se. Havia aguentado o que podia. E seu rosto se deformou num sorriso, no mesmo instante que as roupas coloridas se ergueram em valsa à maestria do vento e bailaram sobre ela e em volta dela. Quando seu corpo caiu para trás, ainda teve tempo de ver o céu rosa - amarelado. Partia para mais uma aventura.






terça-feira, 26 de julho de 2011

Paz e Amor




Hoje assistia ao noticiário na TV, quando saiu uma reportagem sobre uma manifestação pública e pacífica de todos os noruegueses que foram as ruas com flores nas mãos para declarar seu repúdio ao insano que saiu matando todo mundo a troco de nada e para dizer para o mundo que o amor não tem fronteiras. Mesmo que tudo hoje em dia tenha se tornado clichê ou bem próximo disso, mesmo quando tudo e nada faz sentido, ainda me emociono quando vejo uma manifestação pública de amor, seja ele(a) o próximo mais próximo ou o próximo mais distante. Creio que só pelo amor, só pelo bem é que podemos encontrar o paraíso em vida, em nossa vida. Que siga havendo no mundo a paz e o amor, como diriam os que nunca deixaram de crer nisso e até os que já deixaram, mas ainda assim disseminaram ambos no woodstock!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Amor louco



Outro dia estava na praia, tomando um banho de mar gostoso, com um sol bonito, e aquele céu azulão pintado de nuvens brancas, quando entra um casal na água. Ela alta, negra, cabelos cortados bem rente e magra pelo uso excessivo de crack. Ele da mesma altura que ela, branco, cabelos compridos, olhos verdes e magro, pela mesma razão que ela. Nossa! A moça era só alegria. Tudo para ela era lindo! Ela olhava para ele com olhos orgulhosos e gulosos e se jogava no mar, fingindo se afundar em amor. E ele, respondia aos risos, a resgatando, cauteloso. Mais tarde na praça, olha eles lá, despreocupados, andando abraçados, agarrados, parando sob um teto protegido só para acender um cigarro de crack e fumar a sós. Achei aquilo tudo tão poético! Um amor de loucos um pelo outro e pela droga, cola de ligação entre ambos. Num mundo onde o amor tornou-se estilizado, o romance virou clichê. Mais ainda, numa Bahia, onde os homens são tão descarados que as mulheres já entram na relação com medo, cheia de precauções, esperando o momento da traição, desconfiando dos passos, dos olhares, das saídas (e na maioria das vezes, com razão!), o que por si só, diminui a capacidade de entregar-se para o escuro que é esse outro que inspira amor; ver aqueles dois se entregando um ao outro umas vezes sem demora, noutras com urgência, sem se importar com o público, apenas com a paisagem, foi tão inspirador, que desejei eu viver um amor louco, sem o crack, é claro!



terça-feira, 28 de junho de 2011

Apartamentos e Sapatos











Salvador passa por um bum imobiliário. Prédios de 20, 30 andares são erguidos em áreas distintas da cidade num piscar de olhos. E com aspecto cada vez mais modernoso, esses edifícios vão enchendo e poluindo a vista da cidade. Entretanto, a despeito da criatividade dos arquitetos, a descrição sumária de qualquer imóvel considerado novo, comprado ou não na planta é: caixa de fósforos. Essa prerrogativa parece ser tão preponderante que até os programas de TV já dedicam minutos de suas edições para orientar o cidadão a melhor decorar seu pequeno espaço e fazê-lo parecer maior. São usados espelhos, peças flutuantes, TVs que se fixam às paredes, prateleiras, camas com gavetas etc. Aí, você entra no prédio: piscina, salão de jogos, sala de esportes, churrasqueira, sauna, quadra etc. Se encaminha para o apartamento e abre a porta para aquele pretenso luxo vestido de branco, adesivos de parede, sofás-camas retráteis, beliches, mini mesas de centro, mesas de jantar redondas com tampo de vidro móvel - tudo, tudo feito visando a economia de espaço e uma aparência elegante apesar dos poucos metros quadrados. E eu me pergunto: Vale a pena?


Vendo a reportagem sobre como melhor utilisar o pouco espaço da sua nova casa que você passou trinta anos pagando, fiquei me questionando se essa moda não se assemelhava à moda dos sapatos. Desde que me entendo por gente, chique é salto e (pior) fino. Se você vai no shopping, plataforma, se vai no mercado sapatilha, se vai numa festa, salto 15, se vai ao motel, 30. E os dedos dos pés ficam lá, escondidos, espremidos, montados uns sobre os outros, confinados a uma total falta de espaço em troca de uma aparência mais pomposa. Dor, calos, vermelhidão, nada parece findar o ânimo de milhares de mulheres (e também homens) que se cercam de mais sapatos apertados do que seus pés e sua coluna podem suportar, mais sapatos que dias da semana! Antes com a predominância do preto e marrom, basicamente, hoje com o ofuscante (e quase cegante!) rosa choque, azul, verde e amarelo, acompanhados de shorts ou mini saias, tudo muito chique a depender da moda vigente.


Me impressiona a mídia e seu poder. Que convencionou como normal (leia-se normótico - salve Pierre Weil) espremer-se em pequenos espaços ao invés de refestelar-se em grandes áreas abertas. Vá lá que grandes áreas abertas são mais difícies de encontrar e consideravelmente mais caras. Mas prefiro ficar economizando por 30 anos por uma casa espaçosa com área ampla para móveis, circulação de gente, de bichos, de ar, a um restrito catre. Assim como creio que ter os pés livres torna nosso corpo mais livre, mais aberto, para a circulação de ar, de sangue, de emoções e o que mais vier. Um apartamento na Pituba de 120 metros pode parecer chique de longe. Mas um de 300 nos Barris, por exemplo, tem mais pompa, mais classe, mais robustez. Assim como sapatos que permitam o movimento levam o corpo a re-encontrar sua graça natural, sua finesse interior.


Seja um apartamento ou um sapato, acredito que espaço é necessário à vida e defender sua necessidade de área livre faz parte da natureza animal do ser humano e só assim, permitindo-se ampliar os próprios terrenos é que é possível se sentir tão confortável e livre para fazer os próprios olhos e os olhos dos outros brilhar de admiração.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Muitos Carnavais



Ah, o carnaval! Já fui tantas vezes, já pulei atrás de muitos trios, já tomei muita cerveja, cheirei lança – foi inclusive no carnaval que ela me foi apresentada, num murro na minha boca, seguido de um beijo e uma ordem, aspire. Aí, veio uma sirene muito alta que saía de dentro da minha cabeça, uma tontura, mesclada com euforia, a música, qualquer fosse, parecia maravilhosa, novo beijo e mais carnaval. E carnaval, para mim, tinha que ser com muita cerveja, assim, dopada, não via as brigas, os roubos, as milhares de infrações de leis de direitos humanos, cometidos por todos os camarotes, blocos, cidadãos mais abastados, pelos menos abastados, pela polícia... Embebida em álcool, a festa parecia supimpa! As milhares de mãos, que insistiam em me apalpar, puxar, roubar beijo, me derrubar no chão, me imobilizar, me forçar um beijo e me dar a mão para levantar, tudo bobagem, eu não sentia nada! Não que eu fosse um sucesso no carnaval, mas que sempre estava tão bêbada que, notoriamente, parecia ser um alvo fácil. Sóbria mesmo, só babei nos filhos de Gandhi, quando o bloco ainda era composto apenas por negros altos, fortes, lindos, que espirravam água de cheiro no nosso corpo, protegiam as desamparadas e se despediam com um beijo mais terno que sexual. Memórias boas também, quando Carlinhos Brown inventou um corre todo mundo para trás e depois corre todo mundo para frente, quando vi uma senhora bem larga, cair no chão e derramar milhares de latinhas no chão, pedi a Deus para conseguir ajudá-la, mas quando vi, uma roda enorme de pipoqueiros já havia sido aberta para resgatar todas as latinhas da senhora e devolvê-las para o seu gigantesco saco. O mesmo quando perdi e achei minha lente de contato! (quer dizer, acharam. Eu, embriagada, lógico, coloquei a lente na boca e de lá no olho, ganhei uma infecção ocular pós carnaval, mas não fiquei gripada risos). Me apaixonei, pelo menos três vezes durante o carnaval, mas nunca surgiram namoros destes amores carnavalescos, só ficadas mais cumpridas. Mas, hoje, ouvindo e vendo as pessoas passando bem embaixo da minha janela, o cheiro de mijo mesclado com cerveja e suór, o enorme montante de gente que passa com camisas de blocos, camarotes, sem camisa, às vezes, até sem roupa! me dão um desânimo. Acho que nem mesmo bebássa me divertiria. Talvez, tome coragem e vá na rua, pipocar. Mas, por enquanto, vou ficando alcoolizada em casa mesmo e indo dormir. Descobri a fórmula perfeita para dormir bem, com o barulho infernal que insiste em invadir minha casa. Duas latas de cerveja e aí, nossa, durmo tão bem, que esqueço tudo, não escuto nada. Então, escrevendo isto, meu rosto esboça um sorriso. Foram muitas as minhas mudanças ao longo dos carnavais (foram muitas, também, as mudanças do carnaval, na forma, na quantidade de gente etc), mas, quando fico em Salvador, morando na Barra, a única coisa que não parece ter mudado, é o fato de passar todos os carnavais, bebássa! (gargalhadas). Saudades imensas de todos aqueles que participaram comigo das milhares de aventuras carnavalescas, Malara, Violet, Iara, Raquel, Mylena, Majó, Dan, Anaê, e tantos outros, memórias de outros tempos, outra vida. E daqueles, que com certeza, dividiram um cigarro comigo, neste momento casulo como Cris e Lua. A todos, vai meu desejo sincero de bom carnaval. Mas, agora, tenho que ir, estão batendo na minha porta. Mais uma vez, lá vou eu, pipocar. Só pra garantir, vou pegar uma piriguete* kkkkkkkk



* Piriguete, nome dado as mulheres mais fáceis, que todo mundo passa a mão. Os baianos, eita povo criativo, não só lançaram este nome no mercado de relacionamentos, como batizaram a cerveja Skol de 250 ml, pequeninha e mais barata com o mesmo nome. Segundo descobri, todo mundo prefere a piriguete, é chegar, passar a mão e levar, e ainda garantir pagar menos por isso!